Translate

sábado, 18 de abril de 2015

O secularismo explícito do padre Fábio de Melo

Quando os religiosos se calam, são seus inimigos que se levantam e, sem nenhum pudor, vão fazer de tudo para que as pessoas não apenas aceitam os seus valores, mas os absorvam.

Escrito por Fábio Blanco 

Quando eu estava decidido a falar sobre outros assuntos, superando a questão da manifestação pública de religiosos e sua legitimidade, não é que me aparece o padre pop Fábio de Melo e solta, no twitter, uma sequência de pensamentos que são o exemplo perfeito de tudo o que eu venho expondo por aqui? Lançando meia-dúzia de espirros verbais, consequência, certamente, de um vírus modernista que, parece, tomou conta do sacerdote católico, ele acabou expectorando a visão laicista de sociedade que preenchia seu peito e ansiava ser colocada para fora.

O padre afirmou, sem nenhum rodeio, que “a união civil entre pessoas do mesmo sexo não é uma questão religiosa. Portanto, cabe ao Estado decidir”. E já, nisso, constatamos o aspecto esquizofrênico de suas palavras, expondo que é normal alguém ter duas personalidades, uma religiosa e outra pública e que existem questões que são exclusivamente religiosas, enquanto outras são exclusivamente civis. O que talvez ele não perceba, é que essa fragmentação, no ser e também na sociedade, é fruto de uma doença moderna, como bem alertou Francis Schaeffer, em seu livro A Morte da Razão, ao afirmar que, “não se pode ter verdadeira moral no mundo real uma vez feita essa dissociação. [Da mesma forma] não se tem uma base adequada para o direito, para a lei”. O que Schaeffer quer dizer é que, quando se abre mão da unidade do pensamento, quando se separa as ideias religiosas das civis, estas deixam de possuir qualquer moralidade, pois não têm onde encontrar referências. Mas, o que é mais absurdo nisso tudo, é um líder religioso não atentar para essas coisas, se tornando, dessa forma, um promotor dessa amoralidade social.

E, em uma demonstração explícita de sua fé, não em Jeová, claro, mas em Leviatã, Fábio de Melo ressalta que “o Estado decide através dos que são democraticamente eleitos por nós. São eles que propõem, votam e aprovam as leis”. De fato, ele não está dizendo, formalmente, nenhuma novidade, mas dentro de todo o contexto de suas afirmações, é evidente que o que ele está propondo é que as pessoas religiosas não devem tentar influenciar seus eleitos, expondo suas convicções. Como se os representantes do povo, ao assumirem seus mandatos, se desvinculassem de seus eleitores, agindo de maneira autônoma e com base, apenas, em suas próprias ideias pessoais. Ele esquece que os congressistas não recebem uma carta branca de quem votou neles para fazerem o que bem entenderem, mas devem, sim, refletir a vontade de seus eleitores. E, falando do tema levantado pelo padre, até aqui, a maioria da população brasileira não tem se mostrado favorável ao casamento gay. Portanto, suas afirmações não passam de desvirtuamento, uma forma de despistar os olhos das pessoas do problema principal. Na verdade, o que ele está fazendo é exigir que os fiéis de sua igreja calem a boca e assistam, passivamente, os grupos que trabalham a favor dos direitos dos homossexuais impor sua agenda.

Isso fica ainda mais claro quando o sacerdote diz que “aos líderes religiosos reserva-se o direito de estabelecerem suas regras e ensiná-las aos seus fiéis. E isto o Estado também garante”. Ora, se eu não soubesse quem é o padre Fabio de Melo diria que o seu perfil fora hackeado, pois suas palavras passam ao largo do que se espera de um representante da Igreja. O que ele está afirmando nada mais é que os religiosos não têm direito à voz na sociedade. Que eles podem, por causa de uma mera concessão estatal, discutir seus dogmas internamente, mas que não ousem sair de seus currais eclesiásticos. Nem da boca de ateístas ferrenhos lembro ter ouvido palavras tão segregacionistas! Primeiro, não são os líderes religiosos que estabelecem as regras e ele, como um deles, deveria saber muito bem disso. Ao falar dessa forma engana, propositalmente, sua audiência, dando a impressão que as regras religiosas são meros reflexos das idiossincrasias dos homens. E isso é um típico discurso de um inimigo da Igreja. Em segundo lugar, os religiosos são parte, e constituem uma proporção considerável, da sociedade. Não há, portanto, como ignorar suas demandas, sua forma de enxergar a vida e, também, suas rejeições. E, se estamos em uma democracia, como tanto gostam de afirmar esses filhos da modernidade, por que, então, eles não respeitam-na, principalmente quando a vontade da maioria vai de encontro com suas ideologias?

E, quem diria, eu estaria vivo para presenciar um padre falando, abertamente, contra sua própria instituição!? Fabio de Melo, por mais surpreendente que isso seja, não se sente nem um pouco constrangido em estabelecer que “as igrejas não podem, por respeito ao direito de cidadania, privar as pessoas, que não optaram por uma pertença religiosa, de regularizarem suas necessidades civis“. O que ele está dizendo é muito fácil entender. Ele está determinando que a união civil de homossexuais é um direito indiscutível e deve ser permitida, de qualquer maneira. No entanto, para quem acabara de afirmar que religiosos não devem dar palpites públicos, com base em suas convicções, o padre está sendo bem explícito ao dar o seu. Mas, é claro, o que ele quer dizer, na verdade, é que os religiosos não devem influenciar as decisões públicas quando forem a favor da visão cristã. Se, pelo contrário, forem contra o cristianismo, como é o caso da convicção do próprio padre, aí, sim, eles têm direito de falar o que bem entendem e tentar influenciar as pessoas.

Como vimos aqui, e como eu venho afirmando, quando um lado deixa de expor suas convicções, o outro impõe as deles. Estas afirmações do padre apenas corroboram tudo aquilo que eu tenho compartilhado com vocês: que, na política e na cultura, não há vácuos morais, nem de ideias. Se um dos lados se abstém de influenciar a sociedade, ensinando sobre sua cosmovisão, não adianta achar que vai se criar um campo neutro, amoral, livre de princípios. Na verdade, quando os religiosos se calam, são seus inimigos que se levantam e, sem nenhum pudor, vão fazer de tudo para que as pessoas não apenas aceitem seus valores, mas os absorvam, até o ponto que a religião e seus princípios sejam suprimidos completamente.

E, não se enganem, Fabio de Melo não está sendo ingênuo, nem está errando por entender de maneira equivocada a realidade que o cerca. Suas palavras tornam evidente que ele é, de fato, um agente secularista, com convicções secularistas, que está dentro da Igreja apenas para tentar calá-la ou desvirtuar o seu discurso. E se ele ainda usa batina (ah! me desculpem, ele nem me parece muito afeiçoado a essa vestimenta) é porque acima dele também existem alguns que não discordam tanto de tudo aquilo que o padre anda falando por aí.

http://www.fabioblanco.com.br

terça-feira, 7 de abril de 2015

POR QUE O NAZISMO ERA SOCIALISMO E POR QUE O SOCIALISMO É TOTALITÁTRIO


Por George Reisman*

Minha intenção é expor dois pontos principais: (1) Mostrar que a Alemanha Nazista era um estado socialista, e não capitalista. E (2) mostrar por que o socialismo, compreendido como um sistema econômico baseado na propriedade estatal dos meios de produção, necessariamente requer uma ditadura totalitária.

A caracterização da Alemanha Nazista como um estado socialista foi uma das grandes contribuições de Ludwig von Mises.

Quando nos recordamos de que a palavra “Nazi” era uma abreviatura de “der Nationalsozialistische Deutsche Arbeiters Partei” — Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães—, a caracterização de Mises pode não parecer tão notável. O que se poderia esperar do sistema econômico de um país comandado por um partido com “socialista” no nome além de ser socialista?

Não obstante, além de Mises e seus leitores, praticamente ninguém pensa na Alemanha Nazista como um estado socialista. É muito mais comum se acreditar que ela representou uma forma de capitalismo, aquilo que comunistas e marxistas em geral têm alegado.

A base do argumento de que a Alemanha Nazista era capitalista é o fato de que a maioria das indústrias foi aparentemente deixada em mãos privadas.

O que Mises identificou foi que a propriedade privada dos meios de produção existia apenas nominalmente sob o regime Nazista, e que o verdadeiro conteúdo da propriedade dos meios de produção residia no governo alemão. Pois era o governo alemão e não o proprietário privado nominal quem decidia o que deveria ser produzido, em qual quantidade, por quais métodos, e a quem seria distribuído, bem como quais preços seriam cobrados e quais salários seriam pagos, e quais dividendos ou outras rendas seria permitido ao proprietário privado nominal receber.

A posição do que se alega terem sido proprietários privados era reduzida essencialmente à função de pensionistas do governo, como Mises demonstrou.

A propriedade governamental “de fato” dos meios de produção, como Mises definiu, era uma consequência lógica de princípios coletivistas fundamentais adotados pelos nazistas como o de que o bem comum vem antes do bem privado e de que o indivíduo existe como meio para os fins do estado. Se o indivíduo é um meio para os fins do estado, então, é claro, também o é sua propriedade. Do mesmo modo em que ele pertence ao estado, sua propriedade também pertence.

Mas o que especificamente estabeleceu o socialismo “de fato” na Alemanha Nazista foi a introdução do controle de preços e salários em 1936. Tais controles foram impostos como resposta ao aumento na quantidade de dinheiro na economia praticada pelo regime nazista desde a época da sua chegada ao poder, no início de 1933. O governo nazista aumentou a quantidade de dinheiro no mercado como meio de financiar o vasto aumento nos gastos governamentais devido a seus programas de infraestrutura, subsídios e rearmamento. O controle de preços e salários foi imposto em resposta ao aumento de preços resultante desta inflação.

O efeito causado pela combinação entre inflação e controle de preços foi a escassez, ou seja, a situação na qual a quantidade de bens que as pessoas tentam comprar excede a quantidade disponível para a venda.

As escassezes, por sua vez, resultam em caos econômico. Não se trata apenas da situação em que consumidores que chegam mais cedo estão em posição de adquirir todo o estoque de bens, deixando o consumidor que chega mais tarde sem nada — uma situação a que os governos tipicamente respondem impondo racionamentos. Escassezes resultam em caos por todo o sistema econômico. Elas tornam aleatória a distribuição de suprimentos entre as regiões geográficas, a alocação de um fator de produção dentre seus diferentes produtos, a alocação de trabalho e capital dentre os diferentes ramos do sistema econômico.

Face à combinação de controle de preços e escassezes, o efeito da diminuição na oferta de um item não é, como seria em um mercado livre, o aumento do preço e da lucratividade, operando o fim da diminuição da oferta, ou a reversão da diminuição se esta tiver ido longe demais. O controle de preços proíbe o aumento do preço e da lucratividade. Ao mesmo tempo, as escassezes causadas pelo controle de preços impedem que aumentos na oferta reduzam o preço e a lucratividade de um bem. Quando há uma escassez, o efeito de um aumento na oferta é apenas a redução da severidade desta escassez. Apenas quando a escassez é totalmente eliminada é que um aumento na oferta necessita de uma diminuição no preço, trazendo consigo uma diminuição na lucratividade.

Como resultado, a combinação de controle de preços e escassezes torna possíveis movimentos aleatórios de oferta sem qualquer efeito no preço ou na lucratividade. Nesta situação, a produção de bens dos mais triviais e desimportantes, como bichinhos de pelúcia, pode ser expandida à custa da produção dos bens importantes e necessários, como medicamentos, sem efeito sobre o preço ou lucratividade de nenhum dos bens. O controle de preços impediria que a produção de remédios se tornasse mais lucrativa, conforme a sua oferta fosse diminuindo, enquanto a escassez mesmo de bichinhos de pelúcia impediria que sua produção se tornasse menos lucrativa conforme sua oferta fosse aumentando.

Como Mises demonstrou,  para lidar com os efeitos indesejados decorrentes do controle de preços, o governo deve abolir o controle de preços ou ampliar tais medidas, precisamente, o controle sobre o que é produzido, em qual quantidade, por meio de quais métodos, e a quem é distribuído, ao qual me referi anteriormente. A combinação de controle de preços com estas medidas ampliadas constituem a socialização “de fato” do sistema econômico. Pois significa que o governo exerce todos os poderes substantivos de propriedade.

Este foi o socialismo instituído pelos nazistas. Mises o chama de modelo alemão ou nazista de socialismo, em contraste ao mais óbvio socialismo dos soviéticos, ao qual ele chama de modelo russo ou bolchevique de socialismo.

O socialismo, é claro, não acaba com o caos causado pela destruição do sistema de preços. Ele apenas perpetua esse caos. E se introduzido sem a existência prévia de controle de preços, seu efeito é inaugurar este mesmo caos. Isto porque o socialismo não é um sistema econômico verdadeiramente positivo. É meramente a negação do capitalismo e seu sistema de preços. E como tal, a natureza essencial do socialismo é a mesma do caos econômico resultante da destruição do sistema de preços por meio do controle de preços e salários.

(Quero demonstrar que a imposição de cotas de produção no estilo bolchevique de socialismo, com a presença de incentivos por todos os lados para que estas sejam excedidas, é uma fórmula certa para a escassez universal da mesma forma como ocorre quando se controla preços e salários.)

No máximo, o socialismo meramente muda a direção do caos. O controle do governo sobre a produção pode tornar possível uma maior produção de alguns bens de especial importância para si mesmo, mas faz isso à custa de uma devastação de todo o resto do sistema econômico. Isto porque o governo não tem como saber dos efeitos no resto do sistema econômico da sua garantia da produção dos bens aos quais atribui especial importância.

Os requisitos para a manutenção do sistema de controle de preços e salários trazem à luz a natureza totalitária do socialismo — mais obviamente, é claro, na variante alemã ou nazista de socialismo, mas também no estilo soviético.

Podemos começar com o fato de que o autointeresse financeiro dos vendedores operando sob o controle de preços seja de contornar tais controles e aumentar seus preços. Compradores, antes impossibilitados de obter os bens, estão dispostos a — na verdade, ansiosos para — pagar estes preços mais altos como meio de garantir os bens por eles desejados. Nestas circunstâncias, o que pode impedir o aumento dos preços e o desenvolvimento de um imenso mercado negro?

A resposta é a combinação de penas severas com uma grande probabilidade de ser pego e, então, realmente punido. É provável que meras multas não gerem a dissuasão necessária. Elas serão tidas como simplesmente um custo adicional. Se o governo deseja realmente fazer valer o controle de preços, é necessário que imponha penalidades comparadas àquelas dos piores crimes.

Mas a mera existência de tais penas não é o bastante. O governo deve tornar realmente perigosa a condução de transações no mercado negro. Deve fazer com que as pessoas temam que agindo desta forma possam, de alguma maneira, ser descobertas pela polícia, acabando na cadeia. Para criar tal temor, o governo deve criar um exército de espiões e informantes secretos. Por exemplo, o governo deve fazer com que o dono da loja e o seu cliente tenham medo de que, caso venham a se engajar em uma transação no mercado negro, algum outro cliente na loja vá lhe informar.

Devido à privacidade e sigilo em que muitas transações no mercado negro ocorrem, o governo deve ainda fazer com que qualquer participante de tais transações tenha medo de que a outra parte possa ser um agente da polícia tentando apanhá-lo. O governo deve fazer com que as pessoas temam até mesmo seus parceiros de longa data, amigos e parentes, pois até eles podem ser informantes.

E, finalmente, para obter condenações, o governo deve colocar a decisão sobre a inocência ou culpa em casos de transações no mercado negro nas mãos de um tribunal administrativo ou seus agentes de polícia presentes. Não pode contar com julgamentos por júris, devido à dificuldade de se encontrar número suficiente de jurados dispostos a condenar a vários anos de cadeia um homem cujo crime foi vender alguns quilos de carne ou um par de sapatos acima do preço máximo fixado.

Em suma, a partir daí o requisito apenas para a aplicação das regulamentações de controle de preços é a adoção de características essenciais de um estado totalitário, nominalmente o estabelecimento de uma categoria de “crimes econômicos”, em que a pacífica busca pelo autointeresse material é tratada como uma ofensa criminosa grave. Para tanto é necessário o estabelecimento de um aparato policial totalitário, repleto de espiões e informantes, com o poder de prisões arbitrárias.

Claramente, a imposição e a fiscalização do controle de preços requerem um governo similar à Alemanha de Hitler ou à Rússia de Stalin, no qual praticamente qualquer pessoa pode ser um espião da polícia e no qual uma polícia secreta existe e tem o poder de prender pessoas. Se o governo não está disposto a ir tão longe, então, nesta medida, o controle de preços se prova inaplicável e simplesmente entra em colapso. Nesse caso, o mercado negro assume maiores proporções.

(Observação: não estou sugerindo que o controle de preços foi a causa do reino de terror instituído pelos nazistas. Estes iniciaram seu reino de terror bem antes da decretação do controle de preços. Como resultado, o controle de preços foi decretado em um ambiente feito para a sua aplicação.)

As atividades do mercado negro exigem o cometimento de outros crimes. Sob o socialismo “de fato”, a produção e a venda de bens no mercado negro exige o desafio às regulamentações governamentais no que diz respeito à produção e à distribuição, bem como o desafio ao controle de preços. Por exemplo, o governo pretende que os bens que são vendidos no mercado negro sejam distribuídos de acordo com seu planejamento, e não de acordo com o do mercado negro. O governo pretende, igualmente, que os fatores de produção usados para se produzir aqueles bens sejam utilizados de acordo com o seu planejamento, e não com o propósito de suprir o mercado negro.

Sobre um sistema socialista “de direito”, como o que existia na Rússia soviética, no qual o ordenamento jurídico do país aberta e explicitamente tornava o governo o proprietário dos meios de produção, toda a atividade do mercado negro, necessariamente, exige a apropriação indébita ou o roubo da propriedade estatal. Por exemplo, considerava-se que os trabalhadores e gerentes de fábricas na Rússia soviética que tiravam produtos destas para vender no mercado negro estavam roubando matéria-prima fornecida pelo estado.

Além disso, em qualquer tipo de estado socialista — nazista ou comunista —, o plano econômico do governo é parte da lei suprema do país. Temos uma boa ideia de quão caótico é o chamado processo de planejamento do socialismo. O distúrbio adicional causado pelo desvio, para o mercado negro, de suprimentos de produção e outros bens é algo que o estado socialista toma como um ato de sabotagem ao planejamento econômico nacional. E sabotagem é como o ordenamento jurídico dos estados socialistas se refere a isto. Em concordância com este fato, atividades de mercado negro são, com frequência, punidas com pena de morte.

Um fato fundamental que explica o reino de terror generalizado encontrado sob o socialismo é o incrível dilema em que o estado socialista se coloca em relação à massa de seus cidadãos. Por um lado, o estado assume total responsabilidade pelo bem-estar econômico individual. O estilo de socialismo russo ou bolchevique declara abertamente esta responsabilidade — esta é a fonte principal do seu apelo popular. Por outro lado, o estado socialista desempenha essa função de maneira desastrosa, tornando a vida do indivíduo um pesadelo.

Todos os dias de sua vida, o cidadão de um estado socialista tem de perder tempo em infindáveis filas de espera. Para ele, os problemas enfrentados pelos americanos com a escassez de gasolina nos anos 1970 são normais; só que ele não enfrenta este problema em relação à gasolina — pois ele não tem um carro e nem a esperança de ter — mas sim em relação a itens de vestuários, verduras, frutas, e até mesmo pão.

Pior ainda: ele é forçado a trabalhar em um emprego que não foi por ele escolhido e que, por isso, deve odiar. (Já que sob escassezes, o governo acaba por decidir a alocação de trabalho da mesma maneira que faz com a alocação de fatores de produção materiais.) E ele vive em uma situação de inacreditável superlotação, com quase nenhuma chance de privacidade. Frente à escassez habitacional, pessoas estranhas são designados pelo governo a morarem juntas; famílias são obrigadas a compartilhar apartamentos. Um sistema de passaportes e vistos internos é adotado a fim de limitar a severidade da escassez habitacional em áreas mais desejáveis do país. Expondo suavemente, uma pessoa forçada a viver em tais condições deve ferver de ressentimento e hostilidade.

Contra quem seria lógico que os cidadãos de um estado socialista dirigissem seu ressentimento e hostilidade se não o próprio estado socialista? Contra o mesmo estado socialista que proclamou sua responsabilidade pela vida deles, prometeu uma vida de bênção, e que é responsável por proporcionar-lhes uma vida de inferno. De fato, os dirigentes de um estado socialista vivem um dilema no qual diariamente encorajam o povo a acreditar que o socialismo é um sistema perfeito em que maus resultados só podem ser fruto do trabalho de pessoas más. Se isso fosse verdade, quem poderiam ser estas pessoas más senão os próprios líderes, que não apenas tornaram a vida um inferno, mas perverteram a este ponto um sistema supostamente perfeito?

A isso se segue que os dirigentes de um estado socialista devem temer seu povo. Pela lógica das suas ações e ensinamentos, o fervilhante e borbulhante ressentimento do povo deveria jorrar e engoli-los numa orgia de vingança sangrenta. Os dirigentes sentem isso, ainda que não admitam abertamente; e, portanto, a sua maior preocupação é sempre manter fechada a tampa da cidadania.

Consequentemente, é correto, mas bastante inadequado, dizer apenas que “o socialismo carece de liberdade de imprensa e expressão.” Carece, é claro, destas liberdades. Se o governo é dono de todos os jornais e gráficas, se ele decide para quais propósitos a prensa e o papel devem ser disponibilizados, então obviamente nada que o governo não desejar poderá ser impresso. Se a ele pertencem todos os salões de assembléias e encontros, nenhum pronunciamento público ou palestra que o governo não queira não poderá ser feita. Mas o socialismo vai muito além da mera falta de liberdade de imprensa e de expressão.

Um governo socialista aniquila totalmente estas liberdades. Transforma a imprensa e todo foro público em veículos de propaganda histérica em prol de si mesmo, e pratica cruéis perseguições a todo aquele que ouse desviar-se uma polegada da linha do partido oficial.

A razão para isto é o medo que o dirigente socialista tem do povo. Para se proteger, eles devem ordenar que o ministério da propaganda e a polícia secreta façam de tudo para reverter este medo. O primeiro deve tentar desviar constantemente a atenção do povo quanto à responsabilidade do socialismo, e dos dirigentes socialistas, em relação à miséria do povo. O outro deve desestimular e silenciar qualquer pessoa que possa, mesmo que remotamente, sugerir a responsabilidade do socialismo ou de seus dirigentes em relação à miséria do povo — ou seja, deve desestimular qualquer um que comece a mostrar sinais de estar pensando por si mesmo.

É por causa do terror dos dirigentes, e da sua necessidade desesperada de encontrar bodes-expiatórios para as falhas do socialismo, que a imprensa de um país socialista está sempre cheia de histórias sobre conspirações e sabotagens estrangeiras, e sobre corrupção e mau gerenciamento da parte de oficiais subordinados, e por que, periodicamente, é necessário desmascarar conspirações domésticas e sacrificar oficiais superiores e facções inteiras do partido em gigantescos expurgos.

E é por causa do seu terror, e da sua necessidade desesperada de esmagar qualquer suspiro de oposição em potencial, que os dirigentes do socialismo não ousam permitir nem mesmo atividades puramente culturais que não estejam sob o controle do estado. Pois se o povo se reúne para uma amostra de arte ou um sarau de literário que não seja controlado pelo estado, os dirigentes devem temer a disseminação de idéias perigosas. Quaisquer idéias não-autorizadas são idéias perigosas, pois podem levar o povo a pensar por si mesmo e, a partir daí, começar a pensar sobre a natureza do socialismo e de seus dirigentes. Estes devem temer a reunião espontânea de qualquer punhado de pessoas em uma sala, e usar a polícia secreta e seu aparato de espiões, informantes, e mesmo o terror para impedir tais encontros ou ter certeza de que seu conteúdo é inteiramente inofensivo do ponto de vista do estado.

O socialismo não pode ser mantido por muito tempo, exceto por meio do terror. Assim que o terror é relaxado, ressentimento e hostilidade logicamente começam a jorrar contra seus dirigentes. O palco está montado, então, para uma revolução ou uma guerra civil. De fato, na ausência de terror, ou, mais corretamente, de um grau suficiente de terror, o socialismo seria caracterizado por uma infindável série de revoluções e guerras civis, conforme cada novo grupo dirigente se mostrasse tão incapaz de fazer o socialismo funcionar quanto foram seus predecessores.

A inescapável conclusão a ser traçada é a de que o terror experimentado nos países socialistas não foi simplesmente culpa de homens maus, como Stalin, mas sim algo que brota da natureza do sistema socialista. Stalin vem à frente porque sua incomum perspicácia e disposição ao uso do terror foram as características específicas mais necessárias para um líder socialista se manter no poder. Ele ascendeu ao topo por meio de um processo de seleção natural socialista: a seleção do pior.

Por fim, é necessário antecipar um possível mal-entendido em relação à minha tese de que o socialismo é totalitário por natureza. Diz respeito aos países supostamente socialistas dirigidos por social-democratas, como a Suécia e outros países escandinavos, que claramente não são ditaduras totalitárias.

Neste caso, é necessário que se entenda que não sendo estes países totalitários, não são também socialistas. Os partidos que os governam podem até sustentar o socialismo como sua filosofia e seu fim último, mas socialismo não é o que eles implementaram como seu sistema econômico. Na verdade, o sistema econômico vigente em tais países é a economia de mercado obstruída, como Mises definiu. Ainda que seja mais obstruído do que o nosso em aspectos importantes, seu sistema econômico é essencialmente similar ao nosso, no qual a força motora característica da produção e da atividade econômica não é o governo, mas sim a iniciativa privada motivada pela perspectiva de lucro.

A razão pela qual social-democratas não estabelecem o socialismo quando estão no poder, é que eles não estão dispostos a fazer o que seria necessário. O estabelecimento do socialismo como um sistema econômico requer um ato maciço de roubo — os meios de produção devem ser expropriados de seus donos e tomados pelo estado. É virtualmente certo que tais expropriações provoquem grande resistência por parte dos proprietários, resistência que só pode ser vencida pelo uso de força bruta.

Os comunistas estavam e estão dispostos a usar esta força, como evidenciado na União Soviética. Seu caráter é o dos ladrões armados preparados para matar caso isso seja necessário para dar cabo dos seus planos. O caráter dos social-democratas, em contraste, é mais próximo ao dos batedores de carteira: eles podem até falar em coisas grandiosas, mas não estão dispostos a praticar a matança que seria necessária; e desistem ao menor sinal de resistência séria.

Já os nazistas, em geral não tiveram que matar para expropriar a propriedade dos alemães, fora os judeus. Isto porque, como vimos, eles estabeleceram o socialismo discretamente, por meio do controle de preços, que serviu para manter a aparência de propriedade privada. Os proprietários eram, então, privados da sua propriedade sem saber e, portanto, sem sentir a necessidade de defendê-la pela força.

Creio ter demonstrado que o socialismo — o socialismo de verdade — é totalitário pela sua própria natureza.

*Tradução de Fábio M. Ostermann

Estraído de http://tercalivre.com/

"O Brasil 'fez' a Venezuela." Olavo de Carvalho, em entrevista ao jornal A Tarde


O filósofo e professor Olavo de Carvalho é hoje o maior expoente do pensamento de direita em âmbito nacional. Nesta entrevista realizada por e-mail, o filósofo, residente dos EUA, diz que o reavivamento da direita é resposta à prepotência da esquerda que desembocou no assalto aos cofres públicos. Mas ele aponta que somente a "inteligência individual" é capaz de contrapor-se à esquerda em uma "guerra cultural". 

Muitos brasileiros foram às ruas no domingo (15/03) impulsionados, em sua maioria, pelo escândalo do Petrolão e pedindo a deposição da presidente Dilma Roussef. O senhor entende que seja a corrupção sistemática, como apontou o ex-gerente da Petrobras Pedro Barusco, o mal maior gerado nos governos petistas?

Sem dúvida, mas esse mal não surgiu sozinho. Ele nasceu desde dentro de um vasto projeto de poder e é parte integrante desse projeto. Afinal, os crimes de corrupção não foram cometidos para enriquecer este ou aquele indivíduo isoladamente, mas para financiar o PT. Esse é o mal mais vistoso, mas ele não é a raiz, é o resultado final de um processo corruptor muito mais profundo, que começou com a adoção da estratégia de Antonio Gramsci para a tomada do poder e assumiu forma decisiva com a fundação do Foro de São Paulo de 1990. O projeto de Antonio Gramsci consiste basicamente em ludibriar toda a sociedade para que aceite o socialismo sem percebê-lo, até que o partido que comanda o processo adquira - são palavras dele - "o poder invisível e onipresente de um imperativo categórico de um mandamento divino". Nessa perspectiva, o Partido é o único juiz de si mesmo e pode fazer o que bem entenda, sem prestar contas à população e sem nem lhe explicar o que está acontecendo. A corrupção financeira é apenas o aspecto mais exterior que acaba assumindo a corrupção muito mais profunda de toda vida social e política. O Foro de São Paulo se arroga o direito de governar em segredo um continente inteiro, determinando o curso da vida de dezenas de povos, sem lhes prestar a mínima satisfação e, é claro, sem jamais se submeter ao seu julgamento moral. O direito de roubar é só a expressão financeira do direito mais geral de ludibriar.

Esse foi o primeiro movimento de massas identificado com a direita desde o início do governo Sarney. Como o senhor entende esse período de acabrunhamento da direita e o que a fez despertar neste momento?

A estratégia de Antonio Gramsci inclui como elemento essencial a "ocupação de espaços", que significa preencher com elementos da esquerda todos os postos na educação, na mídia, nas instituições culturais e, por fim, na administração pública, tomando de uma possível oposição direitista todos os meios de se fazer ouvir. Nos anos 90, essa operação já foi coroada de sucesso, de modo que já não havia uma oposição de direita não somente no Parlamento, mas em parte alguma. Lula celebrava como apoteose da democracia o fato de que nas eleições presidenciais todos os candidatos fossem de esquerda. A esquerda tinha o monopólio absoluto da palavra, o restante da sociedade caiu na "espiral do silêncio" e perdeu até todo o desejo de falar. Foi só quando a prepotência da esquerda assumiu a forma do assalto geral e cínico aos cofres públicos, que a opinião excluída acabou por se ver praticamente obrigada a manifestar-se de novo.

O senhor é apontado por muitos líderes destes movimentos que pedem a saída de Dilma e que são contra o comunismo como o responsável pela quebra de uma "espiral de silêncio" que marginalizava o pensamento à direita. O senhor vislumbra para os próximos anos um ambiente favorável a verdadeiros debates, uma vez que o pensamento de esquerda é hegemônico entre profissionais de imprensa, na academia e no meio artístico?

A esquerda dominante jamais aceitará o debate franco, pois sabe que vive de mentirinhas tolas e que num confronto honesto sairá sempre perdendo. Sua única esperança é tapar definitivamente as bocas dos discordantes para que não mostrem que o rei está nu. Se queremos restaurar a possibilidade de um debate franco, teremos de impor isso à força.

Em um dos artigos de "O mínimo que você precisa saber para não ser um idiota", o senhor explica porque não é um liberal, mas um conservador. Vê-se nos movimentos a união destas duas correntes. Isto demonstra a incipiência desta nova direita? Qual diferenciação o senhor faz entre elas?

Basicamente, liberais (especialmente libertarians) e conservadores se distinguem porque os primeiros privilegiam a argumentação econômica, fazendo vista grossa à guerra cultural,  que é justamente o ponto principal da estratégia da esquerda. Conservadores, por seu lado, insistem na argumentação cultural e moral ao ponto de às vezes, deixar-se enganar pelo conservadorismo moralista de um Vladimir Putin. Nenhuma corrente ideológica é jamais inteligente o bastante para se mover com agilidade entre as sutilezas da vida política. Só inteligência individual é capaz de dar conta das ambiguidades e astúcias de uma situação política em mutação veloz.

O senhor vem denunciando há anos a influência do Foro de São Paulo sobre a política brasileira e da América Latina. O governo brasileiro não se manifesta contra o que ocorre na Venezuela, por exemplo, onde opositores são presos ou mortos. O Brasil pode chegar a isso?

Acho até engraçado quando ouço advertir que "o Brasil pode virar uma Venezuela". O Brasil "fez" a Venezuela. No discurso do décimo quinto aniversário do Foro de São Paulo, o senhor. Lula confessou isso abertamente. O regime Hugo Chavez foi concebido no Brasil e criado através do Foro de São Paulo. Em segundo lugar, até muito recentemente, a Venezuela estava muito melhor que o Brasil, pois lá havia uma oposição atuante e combativa, enquanto o nosso povo, aceitava com passividade bovina e silêncio de pedra toda imposição do esquerdismo dominante.

Qual a gravidade de o PT ser ligado ao Foro de São Paulo? Por que o senhor defende que o Foro de São Paulo deve ser excluído da política brasileira?

Em primeiro lugar, o Foro articula, numa estratégia global, partidos legais e organizações criminosas de terroristas, de narcotraficantes, de sequestradores. Isso faz dele, como um todo, uma organização criminosa. Em segundo lugar, o Foro atuou de maneira clandestina, negando sua própria existência, até quando foi forçado a admiti-la pelas denúncias sucessivas que eu mesmo divulguei. Como se pode admitir que a política de um país ou, pior ainda, de vários deles, seja determinada por uma entidade clandestina, calculada, nas palavras do senhor Lula "para que ninguém soubesse do que estávamos falando"? Como pode haver normalidade democrática se as decisões são tomadas em conluio com criminosos estrangeiros e se nós, o povo, não temos sequer o direito de saber do que eles estão falando?

O senhor também é um grande crítico do sistema educacional brasileiro. De que forma esta "deseducação" contribui para a formação da hegemonia à esquerda?

A doença principal da educação brasileira foi a adoção do sistema de alfabetização chamado "socioconstrutivista", criado inteiramente por estrategistas comunistas como Lev Vigotsky, Emilia Ferreiro e Paulo Freire para transformar as crianças em servos dóceis de um movimento político, com total desprezo pelo desenvolvimento real das suas capacidades. Hoje em dia está mais do que provado que o sistema socioconstrutivista destrói a inteligência das crianças e produz até mesmo lesões cerebrais. Os responsáveis pela adoção desse sistema são diretamente culpados pelo fracasso retumbante das nossas crianças, amplamente comprovado pelos testes internacionais. Esses homens não são educadores, são criminosos

O senhor defende uma hegemonia da direita? Em que ela seria mais saudável que a atual hegemonia?

Já tivemos uma hegemonia da direita durante o regime militar. Ela fez algumas coisas boas na esfera econômica mas, por ter idéias estereotipadas sobre o comunismo e nada entender da estratégia gramsciana, deixou o campo livre para que a esquerda se apossasse da mídia, do mundo editorial e do sistema educacional. Direitismo não é atestado de inteligência.

Costuma-se apontar o PSDB como a direita brasileira, e aqueles que protestam contra os governos petistas como "golpistas", representantes de uma "elite branca opressora". O que há de errado nestas qualificações?

Não se pode falar do PSDB inteiro, onde há homens bons e maus. O que é certo é que seus líderes mais destacados, como Fernando Henrique Cardoso e José Serra, estão comprometidos até à medula com o esquema do Foro de São Paulo. Estão entre os seus maiores aliados e protetores. Isso remonta pelo menos a 1993, quando o senhor. Fernando Henrique Cardoso teve uma reunião secreta com os dirigentes do Foro e os do "Diálogo Interamericano" que é o think tank da ala mais esquerdista do Partido Democrata Americano. O que se tem feito para esconder o conteúdo das decisões ali tomadas forma uma das mais estranhas histórias de mistério do mundo. Já contei isso várias vezes e não vou me repetir aqui.

O senhor vislumbra um Brasil melhor após o 15 de março? Em que estas manifestações são distintas daquelas de 2013? Por que se diz que em 2013 o povo protestou e agora se diz que foram as elites descontentes e desejosas de um terceiro turno?

Essa opinião nem merece resposta. Basta ver as fotos e vídeos das passeatas para saber que as camadas populares estavam ali muito bem representadas, enquanto a "elite", especialmente a da mídia, fazia o possível para achincalhar o movimento e deformar a sua identidade. Termos como "burguesia", "proletariado", "elite", "povo" etc., na boca de esquerdistas, quase nunca designam conceitos descritivos, ancorados em dados da realidade. São símbolos, estereótipos, slogans e senhas que nada dizem da realidade exterior, mas expressam apenas o sentimento de identidade de um grupo ativista, a mitologia que sustenta a sua existência e unidade enquanto grupo, ao mesmo tempo que delineiam, na mente dos seus membros, a imagem do inimigo ideal a ser odiado, temido e achincalhado - inimigo que, quando não é totalmente inexistente, pelo menos jamais está no lugar onde o apontam.

segunda-feira, 6 de abril de 2015

Caritas: o legado moral do cristianismo

É bom, quando em tempos de galopante descristianização e dessacralização do ocidente, podemos contemplar um ateu tecer loas ao cristianismo e à sua ação construtora da civilização ocidental. Digo isso pois o ateísmo foi o grande responsável, juntamente com o paganismo dos Césares e o islamismo de Maomé, pelo massacre de cristãos aos milhões, durante os séculos. O Comunismo, ateu, matou mais de 100 milhões de pessoas em menos de meio século, e destes "mais de 100 milhões", alguns muitos milhões foram cristãos. Portanto, alegra-me ler um artigo escrito por um ateu, engrandecendo e dizendo a verdade sobre a ação da Igreja no mundo. Não curto muito seus escritos, mas neste digo, obrigado Rodrigo Constantino!

Caritas: o legado moral do cristianismo 
por Rodrigo Constantino

Domingo de Páscoa, lá vou eu falar sobre o legado moral de Cristo. Meu ateísmo não me impede de enxergar alguns fatos. Pagãos no passado foram obrigados a reconhecer que “algo diferente” surgia daquela seita de seguidores do judeu que morreu na cruz. Essa principal diferença era sua propensão à caridade, a forma aparentemente desinteressada com a qual ajudavam o próximo, mesmo aquele de outra seita.
Tomo como base o capítulo “Como a caridade católica mudou o mundo”, do ótimo livro já citado aqui de Thomas Woods, Como a Igreja Católica construiu a Civilização Ocidental. Woods mostra como essa inclinação à caridade chamou a atenção até mesmo de críticos ou inimigos dos católicos, como Volaire, o escritor pagão Luciano e Martinho Lutero, em épocas bastante diferentes.

Os estóicos já enalteciam, de alguma forma, a ajuda ao próximo, mas nada se compara ao que veio com o advento do cristianismo. Afinal, a sabedoria, para o estoicismo, envolvia certa indiferença em relação ao próprio sofrimento, o que era naturalmente estendido ao próximo. Diante da dor, sua ou de outro, o estóico deveria mostrar-se superior, o que levou alguns famosos membros do estoicismo a posturas que veríamos como monstruosas hoje, como a reação de Anaxágoras ao saber da morte do seu filho: “Eu nunca pensei que tivesse gerado um imortal”.
Sêneca, um dos romanos mais sábios de todos, assim se manifestou sobre a piedade: “O sábio poderá consolar aqueles que choram, mas sem chorar com eles; socorrerá o náufrago, dará hospitalidade ao proscrito e esmolas ao pobre [...], restituirá o filho à mãe em prantos, salvará o cativo da arena e até mesmo enterrará o criminoso – mas em toda a sua mente e no seu semblante estará igualmente imperturbável. Não sentirá compaixão. [...] Só os olhos doentes se umedecem ao verem lágrimas em outros olhos”.
Os cristãos mudaram isso. Após seu avanço, o doente passou a ser aquele que não chorava junto, que não molhava os olhos ao ver a desgraça alheia. O novo mandamento de Jesus Cristo, afinal, era claro: “Assim como eu vos amei, amai-vos também uns aos outros”. Uma meta um tanto difícil, quiçá utópica, mas que serviu como um norte para seus seguidores, um objetivo que permanentemente os lembrava de que somos todos iguais, universalizando a caridade. É o que irmãos fazem.

O resultado prático disso foi que os primeiros hospitais, como os conhecemos, foram provavelmente criados pela Igreja. No século IV, a Igreja começou a patrocinar a fundação de hospitais em larga escala, de tal modo que quase todas as principais cidades acabaram por ter o seu. Casos como o dos hospitalários de São João ficaram conhecidos e se espalharam pela Europa.
Os mosteiros medievais tiveram grande papel na caridade, e sua dissolução, no século XVI, levou “a uma drástica redução das fontes de caridade”, segundo o pesquisador Paul Slack. O mesmo aconteceu após a Revolução Francesa, cujo ataque à Igreja abalou a fonte de inúmeras boas obras. Em 1847, a França já contava com quase 50% a menos de hospitais do que no ano do confisco pelos jacobinos.
Que o leitor não se engane: sou um economista liberal, admirador de Adam Smith, e entendo perfeitamente que não é da benevolência do açougueiro que temos carne para comer no jantar. Como alguém que leu toda a obra e escreveu um livro sobre Ayn Rand, também compreendo a importância da “virtude do egoísmo”. O inferno está cheio de boas intenções, e elas sem dúvida não bastam para criar um mundo melhor.
Basta pensarmos na questão da usura, sempre condenada pela Igreja. Ora, depender de empréstimos apenas com base na caridade seria limitar totalmente o mercado de crédito, punindo os mais pobres. O juro é o preço do capital, e a impessoalidade do mercado é sua grande vantagem: não precisamos apelar para os sentimentos para obtermos resultados favoráveis a todos.
Dito isso, não resta dúvida de que um mundo com mais é melhor do que um mundo com menos caridade. Sem atos de caridade a situação seria ainda pior. Afinal, sempre haverá aqueles que ficaram para trás, os necessitados, os carentes, e é louvável o ato de ajudá-los voluntariamente, sem nenhum interesse imediato nisso. Fazer o bem porque isso é bom, sem alarde, sem propaganda, sem esperar nada em troca além da sensação de que ajudou o próximo por empatia.
O que nos leva a questionar os efeitos não só econômicos, mas também morais do welfare state. O Estado de bem-estar social, ao estatizar a caridade, tornou-a compulsória, uma obrigação legal, transformando-a em dever em vez de direito. Isso não foi sem consequências para a própria caridade e para aqueles que a recebem. Muitos passaram a ver como um direito garantido o recebimento de todo tipo de ajuda, ignorando que isso implica no dever de terceiros trabalharem para sustentar tais benefícios. E os cidadãos que já são forçados a pagar pesados impostos se sentem livres da responsabilidade moral de ajudar (ainda mais) o próximo.

O mundo é melhor quando há mais caridade. Mas esta jamais pode ser obrigatória, sob a mira de uma arma. Não há escolha nesse caso. Portanto, não há moralidade. Vale notar que os países mais capitalistas, como os Estados Unidos, são também os mais caridosos e filantrópicos. Ricos empresários doam fortunas para a caridade. O cristianismo teve sua parcela nesse legado moral, sem dúvida.
A tentativa por parte dos socialistas de usar o estado, ou seja, a força para impor tal ato nobre simplesmente anulou qualquer nobreza nele, além de gerar resultados diametralmente opostos àqueles desejados. Solidariedade sim, mas sempre voluntária. Como o próprio Jesus Cristo defendia.



quinta-feira, 2 de abril de 2015

Proteção de Mãe


Ultimamente tenho me apegado mais detidamente à espiritualidade carmelita, mais especificamente às “Teresas”: Santa Teresa de Ávila e Santa Teresinha do Menino Jesus. Apego-me, neste momento, mais especificamente ainda à santa Teresinha do Menino Jesus.

Mais detidamente à nossa Flor do Carmelo pelo gigantismo espiritual que emana da sua famosa e pouco posta em prática ‘Pequena via da infância Espiritual”, segundo a qual devemos fazer-nos minúsculos diante da Majestade de Deus, a ponto de sermos como que brinquedinhos nas mãozinhas do Menino Jesus. A base da espiritualidade da Santa de Lisieux é a passagem evangélica em que Jesus diz que para entrarmos no reino dos Céus, devemos nos reduzir à estatura espiritual de criancinhas. “Ele chamou um menino, colocou-o no meio deles e disse: “«Em verdade vos digo: Se não voltardes a ser como as criancinhas, não podereis entrar no Reino do Céu”

 Obviamente que referia-se Nosso Senhor a uma humilhação espiritual pela qual deveríamos necessariamente passar para nos igualarmos às crianças em inocência, pureza e candura, pois a conformação física é materialmente impossível. Porém, me chama a atenção um aspecto em particular, e que na minha opinião de leigo, o que quer dizer que está livre para ser refutada por quem quer que tenha argumentos para tal, dá um sentido mais profundo `a passagem supracitada e que aos meus olhos de escravo de Nosso Senhor Jesus Cristo pelas mãos de Maria Santíssima, tomo-o por um bálsamo para inúmeras angústias que ultimamente tomam conta da minha vida interior. Sobre estas angústias, falarei mais adiante.

Quando pensamos numa criança, dessas bem pequenininhas, geralmente pensamos nos seus atributos: inocência, candura, pureza, alegria, energia, vitalidade etc. Dificilmente nos atentamos para a realidade primeira de que esta criança, salvo as crianças órfãs, encontra-se sob a autoridade e educação de uma Mãe. Quando leio e medito sobre esta passagem que é basilar para a espiritualidade da “pequena via” de Santa Teresinha, penso que encontra-se no cerne da espiritualidade da pequena Via da infância espiritual, pôr-se sob a autoridade e educação espiritual de uma Mãe. Esta Mãe não haveria de ser outra se não a Virgem Santíssima, Mãe de Nosso Senhor e nossa. Educa-nos a nós, os que nos pomos sob sua autoridade, para que moldados por suas mãos puríssimas, sejamos imagens perfeitas de Nosso senhor Jesus Cristo, e consequentemente possamos carimbar nossos passaportes para a beatitude celeste. Mas além de modelar-nos à imagem perfeita de Nosso Senhor, processo esse que pode levar uma vida inteira e muitos sofrimentos, Maria Santíssima, como Mãe da Igreja e nossa, desempenha um papel fundamental sobre seus filhinhos amados que somos nós: Ela nos protege! Protege-nos das armadilhas diabólicas, dos ardis dos que se põem sob a égide de Satanás; protege-nos de todos os perigos, sejam eles do corpo ou da alma.

Não acredito em uma Mãe que negligencie proteção e cuidado ao filho. Uma cena que para mim é memorável como analogia desta profunda realidade espiritual, é uma cena do Filme de “A Paixão de Cristo”, de Mel Gibson. Numa cena em que desfigurado e completamente chagado Nosso Senhor cai com a Santa Cruz ao ombro, a Virgem Santíssima com sua alma tomada de dores, corre ao encontro do Filho caído lembrando-se de quando o socorria na infância, quando o Divino Menino caía pelas peripécias comuns aos pequenos infantes.

Essas imagens, tanto a evangélica quanto a cinematográfica, acalentam-me o coração num momento em que ele está quase que dilacerado de dor pela Igreja, Corpo Místico de Nosso Senhor Jesus Cristo. Além dos meus próprios pecados que me atormentam muitíssimo, Apostasias, Heresias, blasfêmias e profanações assolam tristemente a Igreja Imaculada de Cristo. Não fosse a Fé, a Fé dos apóstolos impressa na minha alma, eu teria sucumbido.

Tenho firme certeza de que assim como na ordem natural, uma mãe protege seu filho com a força se preciso for, de igual maneira, a Virgem Santíssima protegerá seu Filho, e todos os membros de seu Corpo Místico, com todas as forças das quais dispõe, segundo a vontade de Deus. Isto foi provado pela história, através da formulação dos Dogmas Marianos. Todos os Dogmas Marianos foram formulados paro proteger a Igreja, Corpo Místico de Cristo, das grandes heresias.

Por brevidade, tomarei como exemplo apenas o Dogma da Maternidade Divina, o primeiro a ser proclamado, pelo Concílio de Éfeso em 431, que teve como finalidade proteger a Divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo da Heresia de Nestório, que afirmava que em Jesus Cristo não havia ao mesmo tempo perfeita e completa humanidade, e perfeita e completa Divindade, mas que havia uma Humanidade unida a uma divindade. Logo, a Virgem Maria era chamada de “Christotokos”, ou seja, Mãe de Jesus Cristo apenas em sua humanidade. Com a ajuda de Santos suscitados pelo Espírito Santo como São Cirilo de Alexandria, o Concílio condenou a heresia de Nestório, proclamando que Jesus é Deus, verdadeiro deus e verdadeiro Homem, e que por conseguinte a Virgem Maria é “Theotokos”, ou seja, Mãe de Deus. Desta forma foi proclamado o Dogma da Maternidade Divina de Maria Santíssima e foi protegida pela Mãe, e Divindade do Filho.

O mesmo penso sobre a Igreja hodiernamente. Contemplamos estupefatos uma das maiores crises de Fé pelas quais a Igreja já passou. A crise atinge primordialmente o sacerdócio Católico e consequentemente o laicato. É aviltante o numero assombroso de padres e bispos hereges, pedófilos, apóstatas, blasfemos, negligentes com as almas e desonestos, padres e Bispos esses que vilipendiam tudo o que temos de mais sagrado; deturpam o Código de Direito Canônico da maneira que lhes convém; alteram a Missa para agradar o “povo”; recusam a disciplina eclesiástica, rejeitam o hábito; não pregam o evangelho, dando preferência à política e à toda temática da Teologia da Libertação nas homilias, enfim, proporcionam todos os subsídios necessários para e perdição das almas. Infelizmente o diagnóstico é alarmante: humanamente, lutar contra isso é como tentar empacotar fumaça.

Diante de tão infamante quadro, o que nos resta? Simples: entregar os membros feridos do Corpo do Filho, aos cuidados amorosos da Boa e Santa Mãe! Obviamente temos que condenar as heresias e fustigar as obras diabólicas do Inferno, mas tudo isso é vão se não o fazemos com o auxilio e proteção da Medianeira de todas as Graças, Nossa Mãe Maria Santíssima. Ela nos protege.

Li certa vez uma sentença do Teólogo René Laurentin, que a cada dia que passa, parece-me mais acertada e como que uma rota a seguir: “A mariologia é a garantia da Ortodoxia católica”

Contemplando a Via da pequena infância espiritual de Santa Teresinha do Menino Jesus, essa sentença para mim faz todo o sentido.

Ora pro Nobis Sancta Dei genetrix
Ut digni efficiemur promissionibus Christi


1 - São Mateus Capítulo XVIII v II